sexta-feira, 30 de março de 2012

The Children (2008)

Não há que enganar: no cinema de terror, as crianças ou são vítimas ou são cruéis agentes do crime. Em qualquer dos casos, mostram-se rijas e engendram, afincadamente, os respectivos planos de fuga ou ataque. Raramente falecem – mas se tal sucede é porque o filme precisa de tamanho desaire para, digamos, existir (o caso do clássico Don’t Look Now). Se acreditarmos (e eu acredito mais ou menos) que o cinema do cagaço pode ser uma versão tétrica da vida lá fora, então é justo assumir que há quase cem anos se transportam para a tela os reais medos do desconhecido. Cagaços de meia-noite que se materializam em demónios invisíveis, fantasmas do passado, criaturas bizarras do futuro ou do espaço, animais imprevisíveis (e imprevisível tanto pode ser uma aranha como um crocodilo) e – aí vêm elas – crianças. A psicanálise fica para outro carnaval (ou reunião de pais); interessa aqui assinalar a intemporalidade e a universalidade do tema. Do filhote chifrudo de Rosemary, no clássico de Polanski (que o meu DVD comprado em Espanha designa de La Semilla Del Diablo) às infantes almas penadas do cinema asiático do século XXI, sem esquecer The Omen e seus sucedâneos. The Children, do inglês Tom Shankland, evoca – sem querer – palavras cantadas por Carlos do Carmo: «Parecem bandos de pardais à solta / Os putos, os putos / São como índios, capitães da malta / Os putos, os putos». Eis-nos chegados a outra fórmula costumeira: a criançada que faz patifarias em bando. A canalhada, como se usa dizer para os lados do Douro. Casais amigos (ah, o que esperámos para usar esta expressão tão patusca) levam criançada para uma casa na neve, por alturas do Natal. Os pais são ingleses, bem-apessoados, copo de vinho branco na mão, lareira acesa, malhas de boa griffe, conta bancária a respirar saúde. As crianças são, enfim, crianças, naquela linha estreita entre o saturante e o adorável (e é por isso, no fim de contas, que gostamos delas). Pequenos incidentes ocorrem, prontamente desvalorizados. Os pais, claro, não desconfiam dos petizes. A miudagem não se deixa apanhar. Até que a coisa descamba. Como sempre, não nos alongaremos no que a acção, a seguir, nos dá a ver. Podemos, porém, afiançar que se coisa semelhante acontecesse connosco, já teríamos pegado no carro e dado de frosques – mas, hélas, ainda não somos pais nem entramos em filmes bifes. The Children vinga (e vinga bem, já que perguntam) porque se dá bem com os contrastes: vermelho vivo (do quê, adivinhe-se lá!) sobre brancura de neve; brutalidade em contexto de concórdia natalícia; traição em ambiente familiar de insuspeita tranquilidade. É a antítese do filme «mitra» inglês, em que a insalubridade do meio já antecipa (ou prepara) algo de negativo. Gostámos? Pois claro. Mas já vimos publicidades menos eficazes ao sexo com preservativo.

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