segunda-feira, 9 de abril de 2012

10 Rillington Place (1971)

Aqui há atrasado, a reboque do elogio ao filme slasher, falávamos do serial killer como vilão pobre de recursos e algo monótono no exercício do seu passatempo. Que fique assente que não é nossa intenção dar ideias. O filme consagrado a essa figura reincidente na limpeza do sarampo de terceiros tem outros predicados – especialmente se for bom. A estampa psicológica de um Jason Voorhees nunca foi motivo de discussão (nem me parece que mereça; um slasher não tem que se preocupar com isso), mas a psique cabeçuda de um John Christie (o assassino do número 10 de Rillington Place, adiante apresentado) requer outro tipo de cuidados. Se o filme slasher, pela sua natureza funcional, coloca o acento tónico (ou o ácido sulfúrico, se quisermos ser mais literais) na forma como cada desgraçado é devolvido ao criador (ou seja, na evidência de que não se morre sempre da mesma maneira), o filme de serial killer é mais umbiguista: a vítima importa menos do que os labirintos mentais do seu carrasco. Não raras vezes, o filme sobre um assassino em série é inspirado em situações verdadeiras já dissecadas pela criminologia. Enquanto o slasher é fantasia (e humor e exagero, ao abrigo de um desviante código de honra), este é para mudar as fechaduras da porta. 10 Rillington Place é um filme inglês de 1971, realizado por Richard Fleischer e protagonizado por Richard Attenborough (o irmão mais velho de David, o homem que fez vida a devassar a privacidade de alces e cabritos-monteses). O ano é 1949. No número 10 de Rillington Place mora John Christie e a sua mulher, Ethel (personagem secundária, submissa, irrelevante). No piso de cima, está um apartamento para arrendar. Beryl e Tim Evans (o actor John Hurt) – casal pouco abonado, com uma filha (Geraldine) – tornam-se inquilinos. Mas sem dinheiro, entregues a discussões constantes e com a família prestes a crescer (Beryl está de esperanças), pouco lhes resta a não ser aceitar uma oferta generosa do extremoso senhorio, a quem devem o pagamento da renda – fingindo ter experiência médica, Christie oferece-se para praticar um aborto. O que se segue é o desencadear de um tenebroso caso verídico (que ecoa também acontecimentos anteriores), contado à boa maneira inglesa e com uma interpretação estupenda de um actor (Attenborough) que pensou duas vezes antes de aceitar o papel (não fosse levar com uma marreta ao atravessar a rua). Vem-nos à memória a estética dos filmes da Hammer (a produtora responsável pelos melhores cagaços bifes das décadas de 60 e 70), mas aqui não se brinca às histórias de arrepiar: o sacana do velho era mesmo levado da breca. Aos interessados pelo turismo do macabro: Rillington Place não resistiu ao poder de um bulldozer (nem ao da toponímia: agora chama-se Runston Street).

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