segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

The Innkeepers (2011)

«Ei, tenho aqui uma ideia… é um filme que se passa num hotel antigo e…». A conversa vai boa, o jogo de tabuleiro já foi arrumado, abre-se mais uma garrafa de cachaça (algum infeliz há-de picar o gelo porque a máquina pifou), faz-se zapping entre o VH1 Classic e uma compilação de northern soul. É Sábado à noite, o amanhã resolve-se amanhã, apetece-nos discutir a fase Capitol do Sinatra, mas há uma pobre alma que tem uma ideia sobre um filme passado num grande hotel antigo. Por esta altura, (aspirantes a) argumentistas e/ou realizadores são interrompidos por alguém (doravante designado como «eu») que pergunta: «o quê, tipo Shining?». Eis-nos perante um ponto crítico, uma bifurcação fatal: o momento em que o nosso interlocutor vai tentar vender-nos um filme premiado no festival independente do degole, ou em que assobiará para o lado, temendo a comparação com o filme de Kubrick e trocando-a por teorizações sobre os benefícios do açúcar mascavado. Ti West não é visita lá de casa, mas conhecemos-lhe as manhas desde o meio da década passada: é daqueles tipos que vai em frente, mesmo que lhe falemos no Shining (e ele até tem medo das gémeas do corredor: «Way to go, Kubrick, you ruined us all», terá dito), mesmo que lhe digamos que hotel só há um (o Overlook), mesmo que juremos a pés juntos que mais facilmente nos acagaça com um daqueles vídeos de gatinhos que acabam com o palhaço do It aos berros do que com um filme que se passa num hotel. Ti West sabe disso, e também sabe que estamos a ser picuinhas – nem todos os filmes rodados em aviões respondem a Aeroplano, nem todos os filmes portugueses são passados num bairro social dos subúrbios de Lisboa. Se fosse lá de casa (e, para benefício desta recensão, finjamos que é), falaria do grão, das «cigarette burns» da película, da genuinidade do 8 milímetros, da opulência do Cinemascope, da superioridade do que é retro sobre a vacuidade do que é digital; seria o cliché ambulante que tentou transportar – em bom, diga-se – para The House of the Devil, réplica do filme «babysitter mete-se em sarilhos» do início dos anos 80, ou o momento em que Ti West passou de desastroso aspirante a chico-esperto a chico-esperto com aspirações. Se lhe tivéssemos cortado o pio com um haiku que lemos na revista do Reader’s Digest, não nos teria falado de The Innkeepers, «um filme que se passa num hotel antigo» prestes a encerrar, e onde dois empregados (rapaz e rapariga) asseguram serviços mínimos antes de devolver as chaves ao patrão. Há habitués (mãe nervosa com filha pequena), uma visita inesperada (Kelly McGillis a fazer de actriz retirada, agora dedicada ao espiritismo) e um cavalheiro idoso sedento de regressar ao quarto onde, muitos anos antes, passou a lua de mel. Não demoramos, porém, a perceber que há outro hóspede que dá mais trabalho do que todos os outros – e só a camareira Claire (a vivaça Sara Paxton) parece ter mão (e coragem) para lhe tratar da saúde. Sejamos justos: West é económico, não nos quer dar tudo de chofre e espalha bem as peças pelo tabuleiro. O problema vem depois, quando é preciso pô-las a mexer – e aí tudo nos parece forçado e sem algo mais fecundo que justifique as peripécias que, no último terço do filme, nos são dadas a testemunhar. «Não há facada?», perguntamos-lhe no corredor, com copos vazios nas mãos a caminho da cozinha. E ele começa a falar-nos de açúcar mascavado, um assunto sobre o qual, felizmente, já temos opinião formada.

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