segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Tucker and Dale vs Evil (2010)

Há uma altura, neste demorado flirt com o cagaço, em que subimos para cima do pedestal (construído a partir de ossadas humanas, claro) e mandamos abaixo o slasher movie. Que é básico, previsível, formulaico, que o black é o primeiro a ir e no fim sobra a virgem (ou, no caso de não haver uma, aquela que não andou à stickada no primeiro terço do filme). Essa fase de recusa é o quarto de hora mais imprestável que já experimentámos viver. Ver um slasher movie é um acto de purificação – é como decidir ouvir a «Anarchy in the UK», dos Sex Pistols, depois de tropeçarmos num videoclip dos Emerson Lake & Palmer no VH1 Classic. O slasher é um género geralmente linear porque se baseia no mais monótono e repetitivo (mas não menos escabroso) tipo de crime: o perpetrado pelo serial killer. Com um twist óbvio: a vida real mostra-nos homens (convenhamos, são mais eles) viciados em matar da mesma maneira (não consta que Jack, o Estripador, tenha decidido recorrer ao envenenamento para desanuviar); o slasher dá-nos a conhecer personagens versadas em múltiplas áreas do saber (matar), do golpe fatal de catanada à telecinesia. O truque é este: a constante – e tem de haver uma constante – deixa de ser o modo de agir para passar a ser o modo de cada um destes cavalheiros se apresentar. Alguma vez vimos Jason Voorhees de smoking? Michael Myers de sevilhana? Chucky com crista à Ronaldo? Até na ética o slasher é diferente: nenhum destes vilões costuma recorrer à arma de fogo porque compreende que esse é o recurso mais facilmente ao alcance (é a América, pá) das potenciais vítimas. Ao longo dos últimos anos, e no pós-Scream (mas indo ligeiramente mais atrás, e sem sair de Wes Craven, depois do auto-reflexivo Elm Steet: New Nightmare, de 1994) desmontar o slasher tem sido apanágio do cinema de terror indie (veja-se Behind The Mask: The Rise of Leslie Vernon, de 2006), mas também tarefa de geeks e de tipos com tempo para fazer blogues. Por aqui prefere-se o documentário e, para o efeito, Going to Pieces: The Rise and Fall of the Slasher Film (2006) é manual mais do que suficiente para estudar o código. Tudo isto para chegar a Tucker and Dale vs Evil, filme de 2010 de Eli Craig, bem conseguida inversão de um dos clichés mais salutares do género: a secular hospitalidade dos pacóvios redneck (ou hillbillies, como preferirem) quando juventude da cidade decide passar umas férias no campo. Aqui, os hillbillies tornam-se as vítimas, e ao dizermos isto de rajada não estamos a estragar a surpresa – a coisa torna-se óbvia logo na indispensável cena da loja da bomba de gasolina. Tucker and Dale vs Evil é, assim, um Wrong Turn ao contrário, em que campistas universitários infernizam a vida a dois gebos temerosos que, contudo, aos olhos da malta agressora parecem carniceiros da pior estirpe. A exploração do engano é levada, provavelmente, ao limite, mas há uma certa originalidade neste filme onde cenas românticas não terminam com morte por empalamento, e nem o respeito demonstrado pela cartilha do género (assaz libertina) faz com que consigamos ver mais do que o sutiã da protagonista feminina, Katrina Bowden, a sempre prazenteira à vista Cerie da série 30 Rock – e isto, por amor à reinvenção do género (mas só por isso), é muito bem vindo.

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