quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Shutter (2004)

Se me pusesse agora a praguejar contra os clichés do cinema de terror asiático faria figura de patego por duas razões: primeiro, dificilmente conseguiria sustentar o meu apreço por um género tão codificado como o filme slasher, assente numa quantidade apreciável de reincidências; segundo, estaria a meter no mesmo saco (de sufocante serapilheira, evidentemente) colegiais pálidas que só se avistam em relances (e de forma mais nítida quando faltam 10 ou 15 minutos para o filme acabar), raparigas com negros cabelos escorridos à frente da face (já cá faltavam!), inspectores policiais abnegados, chamadas telefónicas e mensagens escritas do além, gatos malvados, acácias suspeitas (a sério), suicidas em série e sarilhos diversos desencadeados por manchas de humidade no tecto. Convenhamos: há aqui material para incriminar três Coreias (ou para comprar um desumidificador). Shutter, de 2004, é a forma airosa que arranjamos para chutar para canto um debate terror japonês vs terror sul-coreano que vá além da percepção de que só os japoneses atendem telefones dizendo «moshi moshi» – é um filme tailandês, o primeiro que vimos, naquela altura em que não havia maratona de cagaço que não acabasse com uma criança diabólica aparecida sabe-se lá de onde, a arfar com asma (e a desafiar-nos o controlo intestinal). Em Banguecoque, o casal de namorados Tun (fotógrafo e sósia do actor Rodrigo Santoro), e Jane (tailandesa maneirinha) metem-se à estrada depois de uma noite de copos e acabam por estraçalhar uma pobre alma que se insinua à frente do carro. O bom senso mandaria dar uma mãozinha à ensaguentada vítima, mas  o casal, amedrontado, dá à sola e finge que não se passa nada. Está o caldo entornado: nos dias seguintes, as fotos de Tun começam a exibir sombras, como se um convidado especial se tivesse intrometido na altura do «olhó passarinho»; às duas por três, percebe-se que a vítima é uma antiga namorada de Tun, a esquálida Natre. O resto do filme  poderia estar resumido na letra do êxito mais popular de Ágata. Mas também, a atentar no desenlace, na cantilena que Mónica Sintra mais trauteou na vida. É assim o terror asiático: tradição popular e alegorias.

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